O papa fala bem e não chateia ninguém – por Deonísio da Silva

Escritor e Professor Deonísio da Silva

Escritor e Professor Deonísio da Silva

Os padres letrados José de Anchieta e Manoel da Nóbrega eram jesuítas e aprenderam o Tupi-guarani para falar com os índios. O Papa Francisco, que também é jesuíta, aprendeu Português para falar com os brasileiros.

Entre tantas lições, o Papa mostrou que não é preciso baixar o nível para se aproximar do povo. Basta escolher as palavras adequadas ao contexto. Por exemplo, preferiu o popular botar, em vez de pôr, colocar. Em seu primeiro discurso, disse: “Cristo bota fé nos jovens, e os jovens botam fé em Cristo”.

Na quinta-feira, falando a mais de um milhão de pessoas na praia de Copacabana, recomendou: “Bote fé, bote esperança, bote amor”.

O Sumo Pontífice, que é poliglota, vem usando muitas gírias em suas falas, entrevistas e homilias na Jornada Mundial da Juventude.

Seu bom humor também já era esperado. No mês passado, comentando as semelhanças entre o Português e o Espanhol, disse de brincadeira: “o Português é um Espanhol mal falado”.

Suas falas no Brasil foram marcadas por expressões populares. Quando visitava a Favela da Varginha, em Manguinhos, nos arredores do Rio, disse: “Vocês sempre dão um jeito de compartilhar a comida. Como diz o ditado, sempre se pode ‘colocar mais água no feijão’”. E perguntou ao povo: “Se pode colocar mais água no feijão?”. Aplaudido, completou: “Sempre! E vocês fazem isto com amor, mostrando que a verdadeira riqueza não está nas coisas, mas no coração”.

Papa Francisco conversa com religioso durante visita  a favela da varginha no complexo de Manguinhos - zona norte do Rio, neste dia 25/quinta

Papa Francisco conversa com religioso durante visita a Favela da Varginha no complexo de Manguinhos – zona norte do Rio, neste dia 25/quinta

Disse também: “Queria bater em cada porta, dizer bom dia, beber um copo de água fresca, beber um cafezinho. Mas não um copo de cachaça!”. O Papa escolheu por metáfora “um copo de cachaça”, a bebida mais popular do Brasil.

Todavia não foi apenas pelas palavras e expressões que ele cativou o povo brasileiro. Sem conteúdo, as gírias e expressões seriam apenas enfeites de suas falas, que entretanto comoveram a muitos pela sinceridade do olhar, como quando disse: “Aprendi que para ter acesso ao povo brasileiro é preciso ingressar pelo portal do seu imenso coração; por isso, permitam-me que nesta hora eu possa bater delicadamente a esta porta. Peço licença para entrar e transcorrer esta semana com vocês”.

Outro momento em que mexeu muito com as pessoas foi quando declarou: “Não tenho ouro, nem prata, mas trago o que de mais precioso me foi dado: Jesus Cristo!”.

No mesmo instante, aqueles que aguardavam a visita do Papa apenas para fazer negócios, como Eike Batista, cuja fortuna passou de 46 bilhões para “apenas” 300 milhões em poucos dias, deixaram o recinto, segundo o tradicional humor dos cariocas, que também inventaram súbitos milagres do Papa: não foi assaltado na Linha Vermelha, mesmo com a janela do carro aberta; fez o povo aplaudir um argentino; mesmo engarrafado no Rio, ninguém tentou vender-lhe nada; andou de saia em Copacabana à noite e não levou nenhuma cantada.

Esse Papa é uma boa pessoa. E o convívio com uma boa pessoa sempre nos faz bem!

Papa Francisco em Cerimônia na Praia Copacabana hoje (28 de julho de 2013)

Papa Francisco em Cerimônia na Praia de Copacabana hoje (28 de julho de 2013)

Os jovens estão chegando! – por Dom Odilo Scherer

Dom Odilo Scherer - Cardeal Arcebispo de São Paulo

Dom Odilo Scherer – Cardeal Arcebispo de São Paulo

Este artigo foi publicado no Jornal ‘O Estado de São Paulo’ neste sábado, 9 de fevereiro de 2012, tratando da Jornada Mundial da Juventude 2013, que ocorrerá no Rio de Janeiro em julho.

Porém hoje, 11 de fevereiro, o Papa Bento XVI anunciou a renuncia de seu pontificado, que ocorrerá oficialmente neste dia 28 de fevereiro. Nas palavras do Papa :”Estou bem consciente da seriedade desse ato, com total liberdade declaro que renuncio ao ministério como Bispo de Roma, sucessor de São Pedro”, disse Joseph Ratzinger, segundo comunicado do Vaticano.

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Faltam poucos meses para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) no Rio de Janeiro, que ocorrerá de 23 a 28 de julho. Ainda que não esteja sendo matéria especial de notícia, já existe uma grande movimentação para preparar a Jornada carioca: com certeza, ela movimentará no Brasil todo, especialmente no Rio de Janeiro, uma multidão bem maior de visitantes do que os grandes eventos esportivos programados para 2014 e 2016.

As Jornadas Mundiais da Juventude foram iniciadas no pontificado do papa João Paulo II, de maneira despretensiosa, no Ano da Juventude de 1985. Na celebração final, em Roma, com a participação de dezenas de milhares de jovens, o papa entregou-lhes uma cruz de madeira, simples e despojada, recomendando que a levassem ao encontro de outros jovens em todo o mundo, falando-lhes de Jesus Cristo. O êxito daquele gesto foi surpreendente e suscitou as Jornadas, que passaram a ser realizadas, em média, a cada três anos, sempre em países diferentes.

Buenos Aires, Santiago de Compostela, Czestochowa, Denver, Manila, Paris, Roma, Toronto, Colônia, Sydney e Madri já sediaram esses encontros. Todas as Jornadas Mundiais da Juventude contaram com a participação do papa. É ele que convoca os jovens para esses eventos, concebidos como peregrinações. Multidões de jovens têm correspondido ao convite. Em Madri, superando todas a previsões, foram cerca de 2 milhões; em Manila, mais de 5 milhões!

Nas Jornadas há atividades religiosas, culturais e sociais, marcadas por alegria e entusiasmo juvenis. Mais que tudo, porém, as JMJs propiciam às novas gerações uma peregrinação interior, atrás de respostas para as suas interrogações existenciais, e que a Igreja lhes oferece a partir do Evangelho de Cristo e de sua experiência bimilenar. Os jovens têm a oportunidade de interagir e se confrontar com os seus coetâneos, originários das mais diversas culturas e que trazem no coração os mesmos sentimentos. Em julho de 2011, em Madri, havia participantes de quase 200 países. A JMJ tornou-se uma impressionante manifestação global da família humana!

Nesse convívio, os jovens expressam de muitas maneiras a sua fé comum nas celebrações religiosas, em iniciativas culturais e artísticas e em reflexões de partilha sobre os valores comuns que os orientam nos mais diversos contextos em que vivem. Num tempo de grande pobreza espiritual, como o nosso, comparado pelo papa Bento XVI a um “deserto espiritual”, os jovens continuam querendo saciar sua sede de verdade, valores e beleza; com frequência são conduzidos a fontes secas e frustrantes, quando não envenenadas, que não lhes dão esperança nem motivos para viver e apostar suas energias de maneira construtiva. As Jornadas da Juventude são um convite para se aproximarem de Jesus Cristo, que a fé da Igreja Católica reconhece como “o caminho, a verdade e a vida” e que proclamou: “Aquele que vem a mim nunca mais terá sede!”.

Ao encerrar a Jornada da Espanha, o papa Bento XVI entregou a uma delegação de jovens brasileiros aquela mesma cruz de madeira, simples e despojada, que já percorreu vários países do mundo, recomendando que a levassem ao encontro da juventude no Brasil. Desde 18 de setembro de 2011, quando ela foi acolhida em São Paulo, a cruz está peregrinando por centenas de cidades, sendo acolhida com emoção pelos jovens, enquanto se preparam para a próxima JMJ. Também havia sido acolhida por uma multidão de jovens na cidade de Santa Maria (RS), poucas semanas antes do trágico incêndio numa casa noturna em que perderam a vida mais de 230 pessoas, sobretudo jovens.

O Rio está se preparando para sediar o grande evento da juventude em julho próximo. O Cristo Redentor já espera todos de braços bem abertos e a Cidade Maravilhosa se dispõe a expandir ao máximo sua simpatia e sua cordialidade. Entre os peregrinos estará também o papa Bento XVI, que manifestou mais de uma vez o seu desejo de estar com os jovens no Brasil.

Antes de se dirigirem ao Rio de Janeiro, porém, muitos jovens estrangeiros participarão das “pré-jornadas”, promovidas em numerosas cidades do Brasil de 16 a 20 de julho. Serão acolhidos por paróquias, colégios e várias outras organizações da Igreja; famílias também abrirão suas casas, num gesto de hospitalidade que se vai tornando sempre mais raro. Todos virão com recomendação e inscrição feita, acompanhados de religiosos, padres e bispos de seus lugares de origem.

Os jovens de longe poderão conhecer algo da nossa riqueza cultural e religiosa e realizar uma interessante troca de experiências com os jovens daqui. Temos muito a oferecer, mas também muito a aprender.

O enorme fluxo de viajantes, que passarão pelos nossos aeroportos e rodovias, ainda parece um fato hipotético, ignorado ou menosprezado. No entanto, será bem superior ao que se espera para a Copa do Mundo e a Olimpíada. Muitos desejam vir dos mais distantes recantos da Terra: além da motivação própria da JMJ, o fascínio da Cidade Maravilhosa é bem conhecido e atrai. Mas serão, sobretudo, os jovens brasileiros que afluirão aos pés do Cristo Redentor para essa experiência humana, religiosa e cultural, que tem surpreendido cada vez, até mesmo os mais críticos e céticos.

No dia 13 de fevereiro, Quarta-Feira de Cinzas, a Igreja Católica no Brasil vai abrir mais uma Campanha da Fraternidade. O tema não podia ser outro: Fraternidade e Juventude. Os jovens trazem no coração um anseio de fraternidade, que tem que ver com solidariedade, amor, justiça, dignidade e paz. Enfim, desejo de um mundo bom para todos. Com os jovens, e por amor a eles, vale a pena investir em laços de profunda fraternidade entre todos os membros da grande família humana, que mostrará mais uma vez seu rosto jovem na Jornada do Rio de Janeiro.